Marialva’.só.
Marialva, ao contrário de seu nome, era uma boa morena jambo. Dessas de contorcer pescoços e línguas. Era muito falada, extremamente observada. Não era tão nova mas ainda se mantinha na fresca juventude. Casou, separou, tornou a casar e alguns meses depois enviuvou. Sentia-se tão experiente, vivida, que não tinha mais vontade ou necessidade de ter outra pessoa. Pode parecer estranho, mas Marialva não suportava mais ser enxergada. Queria sumir. Queria ser apenas uma brisa, um cheiro silvestre, uma concha no profundo do mar. Foi para a beira das ondas que se desmanchavam brancas e mornas. Deixou o sal lamber sua pele e o sol cobrir todo seu corpo. E ficou. Ficou! Por muitas dias. Por muitas noites. Não saía de frente ao oceano. Também não tinha fome ou sede. Estava plena consigo mesma. Não precisava de mais nada ao redor. Tinha como companhia as lembranças breves porém intensas de sua vida. Lembrou-se de cada homem que a tocou. De cada lábio que a beijou. De quanto gozo entornou. Sorriu quando quase se esquecia da vizinha amiga que há muito tirara sua virgindade. Coisa de criança. Sorria. E durante o passar de sol e lua, Marialva se tocou por cada um. Por todos que a tiveram. E também por todos que sempre a quiseram. Morria de prazer a cada movimento. Eram somente ela, o mar, o tempo e o vento. O povoado conta que Marialva nunca mais saiu de lá. Uns dizem que virou areia. Outros, que seu corpo se misturou às águas salinas profundas e ocultas. O fato é que a verdade mesmo ninguém soube. Marialva virou lenda, virou brisa. Quem chegasse por aquelas bandas poderia jurar sentir um perfume silvestre no ar. E a estranha sensação de querer amar. Se amar. Sem sequer nada em troca esperar.