Eugênia’.Olhar bovino.
Era um casal cru. Sem preliminares ou vozes agudas. De poucas palavras e gemidos que quando vinham, eram de uma sinceridade sóbria. Cresceram na mata, entre terras, gados e leopardos. Traziam um semblante taciturno e se consumiam diariamente como quem bebe água. Quando tinha. Se tapavam de trapos doados mas no calor sufocante nada usavam. Nadavam pelados. Se roçavam. Sem pressa, sem tempo pensado. Ela se entregava aberta e molhada. Ele a adentrava duro e selvagem. Quando terminavam permaneciam grudados, adormecendo sob o amanhecer ou entardecer. Eram completos. Mesmo separados. Ele plantava, ela colhia. E assim, seguia a vida. Vieram os filhos, as rugas, um neto e o tempo. Mas eles deixaram passar. O tempo. Um dia se foram. A casa ficou, o neto tomou conta e um dia se apaixonou. O novo casal falava mais, brigava mais, gemia mais alto, e às vezes, sem querer. Mas amavam igual. E seguiam como um rio os ditos do destino. Treparam tanto que tiveram mais de dez filhos. Cuidaram, envelheceram e retornaram ao pó. Todos no mesmo jazigo. A dezena de crias vivas e soltas continuavam seus caminhos. Cuidando dos animais e das terras. Cruzando entremeios e se multiplicando. Vivendo. Simplesmente vivendo.
. .Tesão . .
Sentados sob o céu limpo, negro e estrelado. Um espaço celeste como teto de um tesão compartilhado em silêncio. O flerte do impossível ou até mesmo possivelmente proibido. A vontade oculta de trazer mãos para a pele do outro, apertando, sentindo, comprimindo. Alisando a textura e se demorando ao percorrer todo o contorno do outro corpo. O silêncio noturno com seus morcegos rasantes na água da piscina. O frescor gélido no pelo arrepiado. Lugar apropriado ao imaginário. O pecado residente em cada um daqueles corpos inquietos, semi tocados, pouco falados, muito contidos. O segredo do que não houve ficara para sempre guardado. Continuando no escuro do quarto.
Marcela’,Dela,
Marcela entrou com tudo dentro de seu vestido vinho e logo depois dentro da boca de Vinicius, o garçom da mega festa de casamento de seu primo. Fizeram ali mesmo, no banheiro, delas. Marcela contorcia a boca buscando uma mudez impossível diante do tesão daquele presente. Ela para ele. Marcela para Vinicius. Vinicius sendo por alguns instantes de Marcela. Juntos, dividindo um quadrado apertado. Ele dentro do aperto dela. De Marcela. Úmida, quente e apertada. Entregue. Suada, lambida, comida. Ele a comida dela. Goza Marcela em volta de Vinicius. Ele tomado dela. Da água. Água deles. Mar e rio no impacto. No exato momento. O gozo, compartilhado. O vestido amarrotado e mal ajeitado voltou para a mega festa de casamento de seu primo. Contornando um corpo quente, úmido, ainda suado. Ofegando baixo, Marcela bebeu mais um pouco, dançou mais um tanto, e cansada, voltou para casa.
.Lar.
Transaram ali na esquina da sala. No cantinho mais amontoado da pequena casa. Casa no mato. Mato com cachorro. Dois. Jorge e Mateus. Labradores doces e fiéis que sempre se calavam quando seus donos se atracavam enrolados em algum lugar dentro ou fora. Lá fora era o verde denso, fresco, fechado como uma floresta sem clareira. Corria um rio discreto e próximo. Era possível ouvir o som de sua evolução sobre a terra. Eles treparam em algumas árvores. Desde sempre, quando crianças já apaixonadas! Lá dentro era o sonho deles. A madeira, as garrafas e telhas que carregaram e colocaram pacientemente em seus devidos lugares. Era pequeno sim, mas muito deles. Cada tom de luz incidia de acordo com o dia ou noite que atravessava cada folhagem ao redor do lar dos dois. Cresceram nos arredondados daquele terreno. Quando podiam ser um do outro sem justificativas. Construíram aquelas paredes, batizaram aquele chão, montaram aquele céu. Se tinham todos os dias. Não tinha hora pois o tempo corria com o rio discreto e próximo! Presentemente vivos, estavam ali, dois corpos amantes, transando na esquina da sala.
Amanda’.Eles.
O amor dela era imenso. Generoso, sem vaidade. Quando via seu amado, só queria vê-lo feliz. Fosse com ela seria a suprema felicidade. Mas se não, iria embora sem olhar para trás. Ela construiu para ele, para eles, uma cama forte e delicada. Ela deu para ele ali tantas e tantas vezes. Seu corpo sentia ser moldado pelas mãos de seu homem, grande e cortês. Ela, junto dele, eram eles. Um casal de alta sintonia e alegria simples! Duas almas entregues. Mas um dia, as mãos dele não quiseram mais os contornos dela. Ele foi esfriando, esfriando… Até que deixou tudo congelado. Ela, Amanda, ainda quente, foi ficando morna e num dia qualquer foi embora. Deixou ele. Deixou eles. Deixou a cama e tudo mais que havia dentro. Só carregou consigo lenha e um pedaço de seu coração.